8.10.14

De um amor morto

«De um amor morto fica / Um pesado tempo quotidiano / Onde os gestos se esbarram / Ao longo do ano». Porque um amorquando se extingue faz ainda parte da substância dos dias e da insuficiência dos dias. «De um amor morto não fica / Nenhuma memória / O passado se rende / O presente o devora / E os navios do tempo / Agudos e lentos / O levam embora». Porque essa memória é a memória de um exílio definitivo, não de uma extinção. «Pois um amor morto não deixa / Em nós seu retrato / De infinita demora / É apenas um facto / Que a eternidade ignora». Porque nada disto, visto do futuro, tem qualquer importância, nenhuma importância.

[de um poema de Sophia de Mello Breyner Andresen]